Existem centenas de milhares de igrejas espalhadas por todo o mundo, confissões de fé das mais variadas possíveis. Crenças que variam nas suas formas ritualísticas oferecidas ao sagrado. Usos e costumes observados de diversas maneiras, desde o mais estapafúrdio, esquisito até ao mais ou menos centrado. De fato desembocou-se no século XXI um enorme fervilhar do sagrado-religioso.
Se analisar atentamente há se observar que as igrejas contemporâneas possuem propostas poderosíssimas para suprir as necessidades do ser humano, talvez seja devido a sua “intimidade” com Deus. Isso mesmo, no cenário religioso se encontra milhares e milhões de pessoas que dedicam suas vidas a Deus e/ou a igreja, e nessa caminhada de dedicação se abdicam de coisas ou comportamentos e/ou praticam determinadas ações, sempre na intencionalidade de estreitar esse relacionamento e agradá-Lo. Nessa dinâmica relacional entre o ser humano e Deus, ao que me parece surgi uma intimidade que estimula os fiéis a ter comportamentos de fé e corajosos diante de situações hostis. É como que se Deus endossasse os clamores por curas, resoluções de problemas, mediações de conflitos entre outras petições.
De maneira que, não é insólito constatar in loco que determinadas propostas religiosas perpassam entre as curas das doenças mais letais, passando pelas restituições emocionais, financiando pela “fé” doações de carros, apartamentos, fazendas ou quaisquer bens materiais e desemboca até mesmo na ressurreição dos mortos. Essas proposições são existentes (ainda que apenas em discursos) desde os grandes, suntuosos e lindos templos religiosos até as construções religiosas mais humildes. De modo que a maiorias das igrejas traz na sua hermenêutica o entendimento que Deus é o poderoso e não há nada impossível a Ele, nessa proposta de manifestação do sagrado todo esse poderio transformador é concedido por Deus do qual essas igrejas são “intimas” dEle.
É importante acalmar os ânimos e registrar que de fato Deus se manifesta com poder curativo e sarador, Ele realiza ações que aos olhos humanos são impossíveis, que Deus tem esse poder (para aqueles que crêem) é passível de crença e crédito. Agora outra coisa é o discurso vazio de muitas instituições religiosas, que porta uma mensagem, mas, contudo não deixa que essa mensagem encarne na prática da vida. Suas rotinas religiosas e litúrgicas são vazias, não tem relevância para a quem de fato precisa, são conhecidas como igreja clube-social, se reúnem semanalmente, até chegam entrar em processos alucinógenos com o sagrado, cantam, choram, expressa corporalmente seus atos ritualísticos, entretanto são irrelevantes para a sociedade, os beneficiados são apenas os associados ou a membresia que freqüenta assiduamente determinados ambientes religiosos. A esses Jesus diria: “os sãos não precisam de médicos e sim os doentes”. E talvez acrescentasse: “deixem as noventa e nove ovelhas segura no aprisco e vá atrás daquela ovelha desgarrada, pois certamente esteja ferida e abandonada e precisará de cuidados”.
A pergunta que me faço é a seguinte: Onde estão as igrejas que acreditam ter uma procuração autenticada por Deus? Por que líderes, apóstolos, bispos e gurus espirituais não deliberam palavras de poder para ajudar no sofrimento das vitimas do Haiti? Onde estão os pregadores da prosperidade para entregar a chave da casa nova? Do carro novo? Ajudar na reconstrução do país? E a teologia da determinação? Onde esta a Teologia da Prosperidade? A Teologia da Libertação com todo seu instrumental humanitário? A Teologia da Missão Integral que prega uma missão engajada e militante? Cadê as mobilizações das igrejas? Dos líderes religiosos? Dos membros?
Sei que faço parte desse processo dialético religioso, e também me sinto culpado e envergonhado diante da impotência de não poder fazer muita coisa em função desse povo sofrido. Sou profundo admirador das propostas da Teologia da Libertação e da Teologia da Missão Integral, assim como muitas outras propostas de fé e espiritualidade, e acredito sim, que tenha muita gente fazendo o dever de casa, mas também tenho a percepção que há a necessidade de descer da nossa torre de marfim e sofrer com os que sofrem. Talvez fosse à hora de muitos executivos da fé, descer dos modernos e luxuosos púlpitos, desligar o ar-condicionado dos seus lindos gabinetes e ter ações efetivas em prol das crianças, adolescente, jovens, adultos e idosos haitianos.
O que não podemos fazer agora é transferir os reflexos desse acontecimento apenas para o campo espiritual, em hipótese alguma discursar que aquele povo foi vitima dos castigos dos deuses. Evitar a qualquer custo responsabilizá-los devido as suas crenças ou a seus costumes. Devemos evitar especulações dos fatos ocorridos e focar nas ajudas humanitárias, nas doações. A catástrofe do Haiti tanto quanta outras abrem na alma humana, feridas que vão além das dores físicas, posso garantir que, o que eles menos precisam agora é; moralismo, julgamentos precipitados, desestímulos, olhares e comentários xenofóbicos, ou seja, jogar o ácido das nossas supostas “verdades”, mas sim o bálsamo terapêutico do amor, da fraternidade, da misericórdia e do altruísmo.
A igreja que permanecerá com seu discurso intacto e legitimo é justamente a igreja que já esta já, encarnada na vida desse povo, tanto quanto outras que estão se mobilizando em todo o mundo. A igreja invisível, imperceptível composta por gente que é gente, que ama gente, que sofre com gente e como gente, talvez não seja instituída, não possua CNPJ, e nem tenha endereço geográfico fixo, mas é formada de milhares de pessoas que são sensíveis ao Espírito da Vida, não são pastores institucionais, mas exerce o pastorado cuidado de vidas, não são diáconos eclesiásticos, mas doam suas vidas na diakonia em prol do outro. Esta igreja é formada de pessoas de todas as tribos, línguas e nações, dos dialetos mais diversos, culturas variadas. Esta igreja instituída por Cristo, não tem como presunção ser numericamente grande, visível, poderosa econômica e politicamente, não é marketeira, mas ambiciona a dignidade humana, tem sede de justiça e reivindicam que os direitos do ser humano devem ser cumpridos para que todos vivam em paz.
Anderson Souza
Bacharel Teologia;
Graduando de Psicologia e
Pós-graduando Metodologia da Ação Docente.